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Disputa territorial entre GO e TO por paraíso turístico chega ao STF após erro em mapa de 1977
Tocantins

Disputa territorial entre GO e TO por paraíso turístico chega ao STF após erro em mapa de 1977

Comunidades Kalungas vivem em área de 12,9 mil hectares sem definição clara de estado, impactando serviços públicos e turismo.

Redação
Redação

13 de dezembro de 2025 ·

A Procuradoria-Geral do Estado de Goiás (PGE-GO) ingressou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para resolver uma disputa territorial com o Tocantins envolvendo uma área de 12,9 mil hectares na região do Complexo do Prata, atração turística da Chapada dos Veadeiros. O conflito tem origem em um erro cartográfico em um mapa do Exército produzido em 1977, que teria confundido os cursos dos rios usados para demarcar a divisa entre Cavalcante (GO) e Paranã (TO).

O equívoco deslocou a linha divisória para cima do território onde vivem comunidades Kalungas, gerando décadas de indefinição sobre qual estado é responsável por oferecer serviços públicos como saúde, educação e infraestrutura. A área disputada equivale a cerca de 12 mil campos de futebol.

Comunidade dividida entre dois estados

O g1 percorreu a zona rural de Cavalcante e esteve na comunidade Kalunga dos Morros, uma das mais impactadas. Os moradores relatam viver em um limbo territorial. Delfino Pereira da Silva, 64 anos, nascido e criado no local, afirma que sempre se entendeu como goiano. "Desde menino, aprendi que aquela terra era Goiás", disse. Ele conta que a região historicamente dependia de Cavalcante para estrada, escola e saúde.

Já o lavrador Gedson Cardoso da Conceição, morador desde 1975, vê a situação de forma oposta. Ao tentar resolver questões documentais, foi informado que sua comarca correta seria Paranã (TO). "Hoje eu me considero tocantinense", afirmou, dizendo ter encontrado respostas mais rápidas do lado tocantinense nos últimos anos.

Turismo e infraestrutura no centro do conflito

A disputa se intensificou com o crescimento do turismo na região do Complexo do Prata. A construção de uma ponte sobre o Rio Ouro Fino, executada pela prefeitura de Cavalcante, tornou-se um marco simbólico. A obra está concluída, mas não foi inaugurada oficialmente, aguardando a decisão judicial.

Moradores relatam que, após a conclusão da ponte, o governo do Tocantins instalou uma placa com os dizeres "Bem-vindo ao Tocantins — O turismo começa aqui". Para a guia turística Marina Costa, de Cavalcante, a sinalização gera confusão entre os visitantes sobre os limites reais. "Muitos turistas acreditam que já deixaram Goiás antes mesmo de chegarem a áreas que, oficialmente, ainda pertencem ao estado", explicou.

Prejuízos e acusações mútuas

O prefeito de Cavalcante, Vilmar Kalunga, afirma que a indefinição causou prejuízos diretos. Ele alega que a distribuidora de energia Equatorial Energia atrasou a eletrificação da região devido à divergência sobre o pertencimento da área. "As famílias continuam no escuro por causa desse erro", disse. Kalunga acusa o Tocantins de se aproveitar da falha cartográfica para avançar sobre a área, motivado pelo interesse turístico e minerário.

Do outro lado, o prefeito de Paranã, Fábio da Farmácia, divulgou um vídeo afirmando que o território pertence ao Tocantins e que o governo estadual presta serviços essenciais na região, citando manutenção de rodovias e extensão de energia. Ele mencionou o "potencial mineral" da área, que estaria sendo estudado.

Histórico de disputas e próximos passos

O Brasil já enfrentou casos semelhantes, como os conflitos entre Paraná e Santa Catarina (Guerra do Contestado) e a longa disputa entre Goiás e Bahia, resolvida pelo STF em 2014. Em Goiás, a PGE pede ao Supremo o reconhecimento da área como parte do território goiano, a desocupação imediata pelo Tocantins, a suspensão de obras e serviços públicos tocantinenses e a retirada da placa instalada na estrada.

O Governo do Tocantins, por sua vez, criou um Grupo de Trabalho Interinstitucional de Defesa Territorial (GTIDT) para reunir documentos técnicos, cartográficos e históricos que embasarão sua defesa no processo. Enquanto a decisão judicial não sai, as comunidades Kalungas seguem tentando viver sua rotina entre dois estados que reivindicam o mesmo chão.

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